Nos anos 80 surgiu um cantor que encantou com seu jeito irreverente e andrógino. Quem seria aquele menino que cantava igual a Elis Regina, usava roupas extravagantes e ostentava um topete de deixar o Pica-pau com inveja?
Após anos de batalha, o sucesso "Meu Mel", música que quase ficou de fora de um de seus primeiros álbuns, catapultou Markinhos Moura para o estrelato. Mas engana-se quem pensa que a carreira desse talentoso intérprete é feita apenas do Hit que o consagrou. Exímio e surpreendente em cada nota e dotado de uma sensibilidade musical rara nos dias de hoje, Markinhos foi além da ilusória "fama" e hoje canta na noite paulistana, no tradicional "Bar do Nelson", recanto de grandes vozes da MPB, no bairro Santa Cecília.
Prestes a apresentar em São Paulo o show que revisita o álbum "Falso Brilhante", de Elis Regina (1976), no dia 13/03, o artista abriu um espaço em sua agenda para um encontro com nossa equipe.
Bem humorado, extremamente simpático, humilde e extrovertido, Markinhos Moura recebeu o Em Neon para um bate-papo delicioso, no qual ele solta o verbo e conta tudo: infância, família, carreira, preconceito, sucesso, amor, e outras coisas jamais reveladas na mídia.
Confira agora a entrevista EXCLUSIVA:
Após anos de batalha, o sucesso "Meu Mel", música que quase ficou de fora de um de seus primeiros álbuns, catapultou Markinhos Moura para o estrelato. Mas engana-se quem pensa que a carreira desse talentoso intérprete é feita apenas do Hit que o consagrou. Exímio e surpreendente em cada nota e dotado de uma sensibilidade musical rara nos dias de hoje, Markinhos foi além da ilusória "fama" e hoje canta na noite paulistana, no tradicional "Bar do Nelson", recanto de grandes vozes da MPB, no bairro Santa Cecília.
Prestes a apresentar em São Paulo o show que revisita o álbum "Falso Brilhante", de Elis Regina (1976), no dia 13/03, o artista abriu um espaço em sua agenda para um encontro com nossa equipe.
Bem humorado, extremamente simpático, humilde e extrovertido, Markinhos Moura recebeu o Em Neon para um bate-papo delicioso, no qual ele solta o verbo e conta tudo: infância, família, carreira, preconceito, sucesso, amor, e outras coisas jamais reveladas na mídia.
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Como foi a sua infância?
Eu nasci em Fortaleza e já no colégio fazia algumas coisas de artes. Com uns doze anos, nas festas do dia do índio, das mães, eu sempre era a atração. Lembro que uma vez, eu acho isso tão ridículo hoje, eu dublei o Ney, você acredita? Até o Ney Matogrosso eu imitava, olha que coragem! (risos) O Ney sempre foi ousado, eu tinha que ouvi-lo escondido da mamãe. Imagina do que eu não fui chamado 300 mil vezes (Risos). Uma vez eu dublei a Elis... Olha a música que eu fui dublar: “Nas Asas da Panair”. Uma música superpolítica, nem eu sabia o que era Panair, depois é que eu fui descobrir... E eu dublando aquela música tensa, séria... Mas eu fiz.
Foi assim que o teatro entrou em sua vida?
Eu vivia sempre fazendo essas manifestações em público. E com o tempo eu fui conhecendo pessoas que me levaram ao teatro. Fiz uma peça toda em cordel e foi meu primeiro contato de meter a mão na massa, pois todo mundo do elenco tinha que fazer alguma coisa. Eu maquiava, fazia um boneco, iluminava, a peça era toda à luz de lamparina. Era um grupo chamado Grita, de universitários de esquerda. Eu não entendia nada e nesse espetáculo, “O Reino da Luminúria”, eu fazia o papel da Repressão, entrava em um saco e vinha rolando pelo palco cantando. Eu não esqueço que um dia o Patativa do Assaré foi ao espetáculo, ele era cego e perguntou ao pessoal do elenco: quem é aquele passarinho que estava cantando?
E a vontade de cantar?
Foi no próprio meio de teatro que eu conheci compositores e comecei a cantar as músicas deles nos festivais. Eu acabava ganhando sempre, por causa dessa coisa de cantar Elis, e o pessoal dizia: "também, né? Assim é claro que ele vai ganhar sempre". Até que eu resolvi participar de um programa local de Calouros. Cantei uma música, ganhei e fiquei indo toda semana como convidado. Em outra emissora, eu também ganhei e me alternava entre um programa e outro. O cachê era um frango assado, um galeto (risos) e, em casa, ficava todo mundo esperando eu chegar com o frango.
Então, você veio de uma família pobre?
Minha família, antes de eu nascer, tinha poses, mas perdeu tudo, pois meu avô jogava muito. Éramos uma família onde não faltava nada, mas éramos pobres. Naquela época vinha muitas coisas de sítios, sacos de arroz, que ajudavam muito, equilibravam a balança da família.
Sua família te apoiou na carreira?
Eu acho que acabei sendo a esperança da família, apesar deles não levarem muito a sério. Houve resistência, quando eu entrei para o teatro, eu tinha sete tios em casa, meio ogros, com aquele pensamento machista. Achavam que o teatro era um antro de drogas, viados, de gente que não presta, então era difícil. Mas a minha avó Teoseta, nome hebraico que significa serva de Deus, sempre teve visão de tudo. Ela era alucinada por mim, eu era seu primeiro neto, éramos muitíssimos ligados, então ela foi brigando por mim. Ela dizia: “ele vai fazer sim, deixa fazer, para com isso”. A mamãe não dava muita atenção e o papai não dava força nenhuma. Quando eu comecei a fazer televisão e as pessoas passaram a me elogiar é que eles viram que eu poderia ser alguma coisa, mas não imaginavam que eu fosse sair de lá... Queriam que eu fosse médico.
Foi nessa época que você saiu de Fortaleza?
Em 1979, meus pais estavam separados e meu pai foi ao Rio de Janeiro procurar emprego. Ele se instalou em uma casa, chamou a mamãe e a gente para se juntar a ele. Fomos, mas menos de dois meses depois, com as brigas constantes e violência, eles resolveram terminar de vez. Eu disse: “Mamãe, vá embora que agora a senhora não tem mais a desculpa de ter que ficar com quem não ama, por causa dos filhos.” Ela foi e eu fiquei, pois papai tinha prometido pagar para mim o curso de teatro do Jaime Barcelos, muito famoso no Rio. Só que ele nunca pagou porra nenhuma, eu que fui atrás.
O rompimento com a minha mãe foi a pior coisa que eu poderia passar. Eu não conhecia ninguém, meu pai era alcoólatra e todos os dias eu chorava, foi muito duro para mim. Aí eu encontrei uma amiga minha, uma comadre, também cantora, a Tetê Cavalcanti. Ela tinha sido convidada para gravar na CBS, mas sacanearam ela. Teve problemas e ficou na rua com a mãe dela. Como só estava eu e meu pai, chamei as duas para morar com a gente, Meu pai ficou enciumado e começou a brigar comigo. Uma noite chegou muito bêbado, houve uma discussão horrorosa, ele começou a me acusar de uma série de coisas, que eu era isso e aquilo... Pra resumir, eu disse que iria embora no dia seguinte. Ele não acreditou e realmente fomos os três para a rua. (Risos)
Depois de um tempo dormindo na casa de um e de outro, encontrei um amigo do Ceará, que também era ator. Ele me apresentou uma amiga, não demorou e eu estava morando com ela, lá na Baixada Fluminense. E montamos um espetáculo para apresentar em escolas, eu atuando e cantando. Eu fazia um espantalho, mas ele era tão lindo que parecia mais a Emília (risos), eu criei uma maquiagem tão circo de Soleil (risos) foi quando eu fiz a peça "Saltimbancos". Não foi aquela montagem gloriosa que teve. Fizemos para participar de um festival em Campina Grande, um festival importante de teatro.
Um dia, eu e essa minha amiga da Baixada, passamos em frente a uma praça e tinha um lugar chamado Bonequinha, olha o nome (risos), com cantor ao vivo, e resolvemos parar lá. Brincando, eu falei: “olha, anota uma coisa, eu vou dar uma canja e vou ‘tomar’ o emprego dessa pessoa.” E foi, eu dei a canja e na semana seguinte eu estava cantando lá. Era uma padaria e em cima tinha um espaço com música, eu cantava e um rapaz tocava violão. Eu cantava tudo isso que eu canto até hoje: Milton Nascimento, Ivan Lins, Djavan, tudo da Elis, Ney, essas coisas. Como nessa época as pessoas ouviam muito esse tipo de música, ali começou a virar um point. Dali eu fiz outra casa maior, investindo em shows mais teatrais. Aconteceu uma coisa engraçada uma vez, inspirado pelo Ney, eu queria fazer uma roupa com muito brilho, mas como não tinha dinheiro, pedi a meu empresário, que tinha uma loja de móveis, para cortarem uns quadrados de espelhos para colar no meu colete. Eu saí com os braços cortados (risos), eu queria algo parecido com o Ney (risos). Coisa doida, né? Mas fui fazendo essas coisas mais teatrais e o pessoal começou a ir, virou um pointmesmo.
Nessa época você estava morando na Baixada...
Não demorou e eu já estava morando em Duque de Caxias, na casa de um pessoal que ia lá me ver toda semana. Como eu morava muito longe para ir lá cantar, eu era menor de idade, tendo que pegar ônibus de madrugada para voltar pra casa, era perigoso. Eles se apaixonaram por mim, a gente se identificou e pediram para eu ir morar com eles. Eu sempre fui dado, né? (risos) Eu morei alguns anos com essa família que me abraçou incrivelmente. Foi quando um empresário, que depois passou a me empresariar, foi lá me ver. Na época, ele patrocinava um programa chamado “O Povo na TV”, com o Wilton Franco, fazia muito sucesso. Foi quando a Elis faleceu. As pessoas já sabiam que eu cantava o repertório e tinha a voz parecida com a dela, que era um menino cantando Elis. Eu estava com 17 ou 18 anos, eu sou péssimo com datas (risos). Uns meses depois, ele falou com o Wilton Franco sobre mim e eu me apresentei no programa.
Depois disso teve o Fantástico?
Foi assim, a minha primeira aparição a nível nacional na televisão foi no “O Povo na TV”, mas a aparição fundamental foi a do "Fantástico". Pois eles começaram as chamadas para o programa numa quinta-feira, anunciando: “De quem é essa voz?” E as pessoas todas querendo saber de quem era. Foi um estouro. Foi quando gravei meu primeiro disco, um compacto com quatro músicas: “Segredos”, “Gente Humilde”, “Edredon de Seda” e “Samba com Pressa”. Inclusive esse compacto teve participação de alguns músicos da Elis. Quem me apadrinhou para gravar esse disco foi o cantor Wando. Ele fez uma coisa linda para mim, ele estava fazendo um show todo montado, com tudo o que havia de melhor na época, no Teatro Bandeirantes. Ele me colocou como convidado especial desse show. Eu cantava com ele e sozinho. Eu começava cantando “Fascinação”, o teatro vinha abaixo, uma comoção enorme. Foi o Wando que gravou o violão na música “Fascinação” que gravei para o "Fantástico".
Esse primeiro disco foi independente?
Não, foi com a minha primeira gravadora, a Copacabana. Eles assinavam contrato de cinco anos e o pior é que a gente reclamava. Olha a falta que faz hoje. Depois desse disco, a gravadora queria me tornar mais popular: “Vou fazer o que com esse menino? Ele não sabe se é a Elis, se é Ney, se é os dois, galã não é”, foi aí que eu fiz “Cara de Durão”. A gente precisava gravar um disco que tocasse, nem que fosse no interior, se não eu não iria mais gravar. Essa música me fez dar uma respirada.
Mas o sucesso mesmo veio com “Meu Mel”?
Eu tinha um último disco para fazer pela Copacabana e tinha que apostar tudo. Meu produtor teve a ideia de gravar com o grupo Roupa Nova, eles gravavam com todos os grandes artistas da época: Gal Costa, Amelinha... E nós fizemos. Dentro desse repertório, eu gravei até Sérgio Bandeira e rock progressivo. Pensei “é o último disco e vou fazer algo diferente”. O produtor fez a versão do “Meu Mel”, que era uma música em inglês chamada “Music”. Eu odiei a música. Achei chata. Melosa. Aquela história, né? “Quero ser um grande cantor, cantar Milton Nascimento”. Aquelas bobagens que a gente coloca na cabeça. Daí que a música não entrou no disco, não chegou a liberação a tempo. O disco foi lançado, não aconteceu porra nenhuma nem tocou merda nenhuma. Daí a música “Meu Mel” ficou sobrando e resolvemos gravar inúmeras fitas cassetes e fomos mandando às rádios. Íamos até elas, às vezes três horas da manhã, a música foi tocando e a gravadora viu o potencial dela, mas esse processo durou mais ou menos um ano.
Sim, mas não pense que não rolou jabá... Ah! Rolou sim. A gravadora investiu muita grana e a gente investiu também. Acabou o contrato com a Copacabana e eu era louco para ir para a PolyGram, que era a gravadora da Elis. Eu queria gravar naqueles estúdios, queria estar ali. Meu produtor, Paulo Debétio, ele é autor daquela música da Simone, “Uma Nova Mulher” e “Tieta do Agreste”, ele agenciou a minha contratação com a PolyGram. Quando eu fui para lá, a outra gravadora ficou puta da vida. E com o sucesso que “Meu Mel” fez, a Copacabana juntou um monte de músicas com ela e lançou um LP com a chamada “Markinhos Moura incluindo o sucesso Meu Mel”, fizeram um retalho, sabe? Foi assim, foi nessa época que eu coloquei a gravadora na justiça, para fazer uma auditoria. Há dez anos, eu ganhei essa causa para receber os direitos de vendagem de “Meu Mel” e até hoje eu não recebi.
Você ganhou a causa e não recebeu?
Sim, ganhei a causa, martelo batido, mas dinheiro mesmo não recebi um tostão até hoje. Esse mel não foi nada doce para mim, açucarou (risos). Claro que eu gosto da música, me trouxe muitas alegrias, fiquei conhecido e reconhecido por ela. Daí eu brinco com essa história de não querer cantar mais essa música, mas é aquela coisa, são trinta anos cantando ela... Roberto Carlos canta “Emoções” em todos os shows, mas quantas dezenas de outras músicas ele tem? Eu não tenho. Porque as pessoas ficam pensando que não há vida depois de “Meu Mel”, que só foi essa música na minha carreira. É por isso que eu fico com raiva (risos). É como quando estou fazendo o show da Elis, um projeto que eu tenho, o “Eternamente Elis”, e as pessoas sabem que é um projeto em homenagem à cantora e ficam me pedindo para cantar “Meu Mel”, daí eu digo que a Elis não gravou isso (risos).
E como você se vê nas reprises do "Cassino do Chacrinha" e "Globo de Ouro" no Canal Viva?
Eu agora vejo mais, mas eu ficava fugindo disso um pouco, por me ver tão novo, por me fazer recordar coisas tristes também, pois não foram só flores. Então me doía um pouco... Hoje eu me olho mais, mas sempre me criticando, “ai, olha o cabelo, olha isso e aquilo” (risos). Todo mundo nos anos 80 era andrógino, todas as capas de disco que eu vejo, os homens pareciam meninas. Os "Menudos" pareciam meninas (risos). E eu queria realmente dar uma chocada, apesar de nada mais chocar naquela época, mas eu não queria que a gravadora me transformasse num galãzinho que eu não era. Eu queria ser reconhecido pela voz. Quando eu fiz o disco “Sem Pudor”, foi um grito de socorro.
Você sofreu preconceito pelo seu visual?
Eu não sentia preconceito das pessoas, dos fãs. Mas, no meio musical, eu sentia sim, de pesos pesados, que eu fiquei sabendo depois, que falavam “canta demais, mas aquele jeitinho...” Eu sempre incomodei e quando aconteceu aquela superevidência por causa da Elis, alguns produtores me evitaram, como se tivessem medo de estar chamando atenção demais, sabe aquela coisa: “o que esse cantor do Ceará veio fazer aqui, tá se achando?”
Eu fiquei doente, pelo fato de eu ter começado muito cedo, eu ultrapassei muitas fases, eu tinha que trabalhar muito e não vivi a adolescência, essa coisa normal que as pessoas têm, de ir para a festa, paquerar, eu não tive nada disso. Tive muitas perdas, a minha própria avó eu perdi, foi uma coisa horrorosa pra mim e, dentro dessas perdas, veio a gota d’água, que foi a não renovação do meu contrato com a PolyGram; Isso realmente me deixou sem chão. Porque eu passei praticamente a vida inteira sem resolver nada, as pessoas que resolviam para mim, eu tinha dez pessoas que faziam as coisas por mim, e eu tive que reaprender a minha vida todinha. Por conta dessa coisa toda é que eu tive síndrome do pânico, na época não sabiam direito o que era isso. Eu não tinha vontade de nada. No dia que eu fui fazer a rescisão de contrato eu cheguei em casa, me tranquei no quarto, coloquei Elis altíssimo, peguei uma garrafa de vodka e me perguntei “e agora?” Fiquei nessa. E a síndrome foi se agravando, eu não conseguia trabalhar, eu não tinha forças e nem tinha onde trabalhar. E as coisas foram indo embora, vendia uma coisa, vendia outra... Os amigos que eu tive é que seguraram a onda para mim. Eu até marquei o dia para morrer. Não tinha coragem de reagir, não tinha vontade de nada, me sentia um nada, me sentia muito só. De repente você tem uma gravadora que te dá um respaldo e respeito. Você vai ao açougue e é tratado melhor que todo mundo e quando acontece tudo isso, no dia seguinte você não tem mais nada... É foda. Daí cadê essas pessoas que gostavam de mim? Que viviam na minha casa? Depois eu entendi logicamente, mas na hora você não se dá conta.
Passei um ano me tratando, de diversas fontes. De manhã tinha uma senhora católica que vinha em casa e ela me rezava. De tarde vinha uma evangélica e ela me orava. Foi quando eu me aproximei mais do espiritismo, eu sou espírita, fiquei um ano me tratando num centro espírita do Rio de Janeiro, num pronto socorro espiritual. Ao mesmo tempo com médicos e remédios. Eu não estava curado ainda, estava em Sorocaba, fazendo um tratamento espiritual com um médium muito famoso e uma pessoa que morava comigo me ligou dizendo ter uma pessoa querendo que eu fosse para Hong Kong inaugurar um complexo de diversão. Tive que pensar muito rápido, pensei “eu tenho que sair daqui, não vou ficar aqui assistindo de camarote o É o Tchan, essas coisas, não vou, o que eu vou fazer? Eu vou pra lá, não sei o que vai acontecer, mas acho que é Deus que está me tirando daqui”. No dia seguinte, fui para o Rio e em dois dias para Hong Kong. Foi barra pesada, não pelo lugar, tudo que me prometeram eu tive, mas eu ainda não estava curado, então eu me via caindo no palco, desmaiando, e era tudo coisa da minha cabeça, e eu fazia o show com medo, mas aos poucos fui ganhando confiança, via que ia até o fim do show sem cair ou desmaiar. Foi uma temporada de três meses.
Mas acabou não fazendo só Hong Kong, não é?
Quando eu voltei, fui para o Japão com esse mesmo pessoal e trabalhei um ano. Depois fui a Miami. Lá conheci o músico gaúcho Ari Piassarollo, ele me chamou para um churrasco, eu iria voltar dois dias depois para o Brasil. Ele estava lançando um grupo chamado Alma, que cantou lá no churrasco, me chamaram para cantar uma música com eles e quando eu acabei de cantar ele falou que eu não viria embora, que iria cantar com eles como convidado no show do Scala. Eu disse que não podia, que nem tinha onde ficar e ele falou que eu ficaria morando na casa dele, que a esposa dele trabalhava com imigração e cuidaria dos meus papeis. Eu não acreditei. Como eu realmente era vira-lata, era mais uma casa de família onde eu moraria (risos).
Daí ficou uma temporada em Miami...
Olha, foi muito bom, mas aquela coisa, você chega até determinado lugar e dali não passa. Eu tive fita minha nas mãos do Emilio Estefan, marido da Gloria Estefan, mas por eu ser brasileiro, ele não ia deixar de dar oportunidade a um cubano para dar para mim, embora eu fosse melhor do que eles. Eu fazia festas e tudo mais, mas estagnou. Daí, acho que em 1993, me chamaram para fazer show três meses em um transatlântico, o Rembrandt. Eu viria de Miami para o Brasil com ele. Fazendo a Costa Brasileira e indo para a Argentina, por dois anos e meio. Quando voltei ao Brasil já estava tudo diferente, eu não conhecia mais ninguém.
Voltou para o Brasil para morar onde?
Fui morar em Curitiba, não queria mais cantar. Fiquei sem fazer nada e, em 2001, entraram em contato comigo para fazer uma regravação de “Meu Mel” no disco “Acústico Brasil”, foi quando eu voltei para o Rio de Janeiro. Nunca recebi um tostão por essa gravação. Mas eu acho que o universo conspirou para que eu voltasse para o Rio. Foi bom, pois eu estava em uma solidão tremenda em Curitiba. Fora o frio e a depressão. Engraçado que depois disso eu não lembro o que é que eu fiz. Sei que, aos poucos, eu fui voltando com uma coisa ali, outra lá.
E sua família, onde estava nessa época?
Nesse ínterim, meu pai faleceu, houve uma reaproximação da gente, pois fui a única pessoa que estava com ele quando ele faleceu. Depois de todas aquelas críticas, a pessoa que estava lá para reconhecer o corpo dele fui eu, mas a gente já tinha se reencontrado e se perdoado. Estava tudo bem, eu sentava no colo dele, o beijava, e ele brincava comigo dizendo “Tem pai que é cego”, e eu perguntava por que ele não tinha sido assim antes, por que demorou tanto para ficar assim? E vieram perdas, mais perdas, mais perdas. E, no Rio, eu morei na Barra com uma amiga que eu amava e que me amava, mas a minha vida era ir à praia, sentar num quiosque, beber uma cerveja, depois ia para casa e no dia seguinte a mesma coisa. Nada acontecia, nada profissionalmente acontecia e eu comecei a ficar depressivo. Porque eu não produzia e comecei a me questionar em não querer envelhecer bebendo em quiosque. Eu tinha que fazer alguma coisa.
Foi quando conheci o produtor Tiago Marques Luis, que tem um trabalho muito bonito, ele que fez todos os discos do Cauby Peixoto de uma época para cá, fez também a Ângela Maria, a Alaíde Costa, a Vânia Bastos... Ele é um menino novo, mas com uma visão sobre o que é musica muito bacana, ele resgata muito essas pessoas, ele fez agora a Maria Alcina, esse último disco elogiadíssimo. Ele vivia me assediando, no bom sentido, para que eu viesse a São Paulo. Até que eu resolvi arriscar. Voltei para São Paulo e ele fez um disco muito lindo comigo, que é o “Mulheres e Canções”, onde eu homenageio as mulheres. Fui morar com uma família, mais uma (risos), em Santo André e depois com ele um tempo, na Bela Vista, muita gente me ajudou. Foi quando eu fiquei nesse apartamento, do qual eu mudei agora. Eu ficava me perguntando: “Como vou pagar o próximo aluguel? Comer tudo bem, mas como pagar o aluguel?” Eu tinha que dar o braço a torcer e tinha que fazer alguma coisa. Foi quando eu tive uma ideia... Eu conhecia a Lilian Gonçalves há muitos anos, eu falei com uma amiga que trabalha com ela, a Luciene, e falei que não podia mais ficar naquelas condições, que era humilhante demais. Eu já não tinha mais 20 anos. Pedi que ela marcasse uma reunião minha com a Lilian. Fui fazer uma proposta para ela. Cheguei e disse: “Olha, eu não quero cantar”, e ela: “Como não quer cantar? Você tá louco? Você não pode parar de cantar. Você é uma estrela.” E eu disse que estava cansado dessa coisa de estrela, que eu estava precisando era de dinheiro. Propus de receber as pessoas, ser host. Ela resistiu, disse que ficaria muito chato. Eu falei que precisava disso, pedi para que me deixasse trabalhar, mas eu não queria cantar. Ela aceitou e me deu um prazo de três meses e foi quando eu vim trabalhar de host, o que para mim não era nada demais, é uma coisa que se faz muito lá fora. Na verdade, eu acabo sendo um host sempre, pois as pessoas me conhecem.
Foi quando você começou a trabalhar no Bar do Nelson?
Sim, mas foi duro, foi difícil para mim me ver daquele jeito. Tinha gente que chegava e dizia: “Nossa, você é porteiro agora?” E eu dizia que não, que não era porteiro, mas se precisasse ser, eu seria. Aí essas coisas, esses comentários, me feriam. Pessoas dizendo: “Nossa ele fez tanto sucesso..." Tinha aquelas que queriam se desculpar com você e diziam: “Você vai sair dessa, não se preocupe.” E eu dizia que estava muito feliz, que a pessoa não estava entendendo, eu não estava com raiva, estava pagando minhas contas, trabalhando. Foi quando os programas de TV começaram a cobrar da Lilian, como ela me colocava ali de host, que meu lugar era cantando, praticamente agrediam a Lilian. As pessoas começaram a pedir para a Lilian para que eu cantasse pelo menos uma música e ela me pedia para cantar. Comecei cantando uma música ou duas até que ela falou que meu lugar era no palco, cantando e não de host. E então eu comecei a cantar no Bar do Nelson, em Santa Cecília, onde estou há três anos.
Em termos discográficos o “Sem Pudor” foi seu último disco?
Se falarmos de disco feito por uma gravadora, sim. Mas de forma independente fiz o “Autorretrato”, gravado ao vivo em Curitiba, depois o “Mosaico Brasileiro” e por último foi o “Mulheres e Canções”.
Sabe que eu perdi o ânimo? Me pergunto por que gravar um novo CD? Para vender para os amigos? Hoje em dia a gente grava um CD e ele fica “parado”, tem que ter dinheiro para fazer esse CD “andar”. Até penso em fazer um EP, mas tudo envolve dinheiro. Claro que temos o “auxílio luxuoso” de um que diz que fará sua capa, outro as fotos, mas mesmo assim tem que ter dinheiro. E o pior é que ao ir a programas para divulgar, eles não deixam você fazer música nova... Há 30 anos eles sempre querem que eu cante “Meu Mel”, eles não me deixam mostrar outra coisa. E, como preciso divulgar, tenho que fazer. O que amo aqui no Bar do Nelson é que tenho a oportunidade de cantar coisas diversas, fazer o meu repertório, reencontrar um público maravilhoso. É uma catarse.
Ele foi criado pela atriz Luciene Cunha que fez parte do “Elis em Movimento”. Quando o Bar do Nelson era o Viva Maria ainda, eu fui fazer uma temporada de três meses lá e ela surgiu com esse projeto, que ela já fazia. Ela conhecia o meu trabalho. Eu fiz algumas apresentações com o Miele. O show tem a versão com e sem ele. Miele sabe tudo de Elis, conviveu muito com ela. Então ele contava causos e eu ia pontuando com música. Mas já faz um tempo que eu faço o show sozinho. Não há uma ordem cronológica, eu vou contando a história dela através das músicas que ela gravou e cantou durante a sua carreira.
A Elis marcou muito a sua vida e a sua carreira, como você descobriu Elis?
Na minha casa ouvíamos muito rádio, ouvíamos Dalva de Oliveira, Ângela Maria, Agnaldo Timóteo, esses músicos maravilhosos. Na casa dos meus tios, eles eram muito antenados, eles tinham uns fascículos culturais de MPB que traziam a história do artista e um disco, eu ia lá e ficava ouvindo: Gil, Caetano, mas Elis logo me fisgou. Quando eu fiz 15 anos, mamãe me deu uma vitrola e eu só ouvia a Elis e ela com raiva: “Não larga mais essa mulher? Tá apaixonado por ela? Que mulher chata!” (risos) E aí eu descobri uma técnica, que eu queria muito ouvir a minha voz gravada. Descobri que se eu colocasse um gravador perto da vitrola e gravasse cantando junto, eu me ouviria naquele arranjo. Foi quando eu me ouvi e comecei a me adequar na voz, nos graves, nos agudos, então meu sonho se concretizava. E eu aprendi não só a cantar com a Elis, mas como a Elis. Não me pergunte como, mas foi assim. Eu ficava ouvindo a respiração, a coisa da boca. Foi através da Elis que eu conheci Milton Nascimento, Ivan Lins, Ney Matogrosso, esse universo todo. Mas hoje em dia, a música mudou muito, só que eu continuo com a essência da boa música. Muitas vezes eu pensei em ceder, por causa da sobrevivência. Também vi muitos colegas de trabalho que eu olhava e pensava: "não quero acabar desse jeito".
Eu acho que uns nascem para amar e outros para serem amados. Eu nasci com um grande potencial para doar amor, mas não esse tipo de amor. Nunca deu certo para mim, não sei como é que é. Eu nunca tive ninguém. Eu até me apaixonei, mas por pessoas erradas, impossíveis. Acho que não era para eu encontrar mesmo, porque eu pensava “pô, se qualquer pessoa, até mesmo um mendigo, conhece a sua pessoa, tem aquele carinho, eu nunca tive e não vou ter isso? Nunca? Não é possível.” Então eu cheguei à conclusão que não é para eu ter, e nessa altura do campeonato... Não vou ter. É muito difícil, pois como eu não tive essa vivência de casamento... É fácil viver com três ou várias pessoas como eu já morei, mas eu nunca tive esse tipo de convivência e sei que agora eu não vou conseguir aguentar, porque agora eu sou independente, eu me gosto assim, então por isso também se torna difícil. Acabei canalizando o meu amor para a minha mãe, para os meus amigos, é onde eu sou craque. Só que passou para esse amor que a gente pode chamar de amor amoroso, sou um fracasso total. Mas não quero ser o coitadinho, o vitimado, pois o amor dos meus amigos me preenche muito. E vivo numa boa com isso. Acho até que eu possa ter feito muita gente se apaixonar por mim, embora eu não tenha percebido. Então eu não acredito nesse amor, mas assim, tudo bem, se vier é lucro. (risos). Que venha do jeito que eu gosto.
Como você encara a maturidade?
A gente foge muito dessa coisa de falar da maturidade, ela é isso de você se colocar no mundo, de saber o porquê de você estar no mundo. E essa coisa de dizer que é bom envelhecer, não é bom porra nenhuma, pois você vai perdendo as pessoas, é muito duro isso. Seria bom eu ter a cabeça de hoje e o sucesso do passado. (risos) Mas nada é tão perfeito assim. Mas a idade é uma coisa que tem muita influência no meio, a verdade é dolorosa. Para muita gente, quando você passa dos 40 anos, já está velho, ultrapassado. Por isso, eu sempre fui uma pessoa vaidosa, eu brigo com o tempo, porque a gente sofre, dizer que não sofre é men-ti-ra. Quantos testes eu fui fazer para musicais e não passei, porque preferiram um novinho. É uma realidade do Brasil. E assim, eu amo cantar no Bar do Nelson, mas não quero ficar só cantando lá, também quero produzir, quero fazer outras coisas e principalmente voltar ao teatro. Estou aberto às possibilidades.
E as próximas novidades de Markinhos Moura?
No dia 13 de março, eu faço uma apresentação do show “Falso Brilhante” no Teatro Martins Penna, no Largo do Rosário, 20 – na Penha, em São Paulo. O show será às 20h. Quero muito ver todos lá.
E como os fãs e empresários podem encontrar você?
Por: Eduardo Moraes - CLIQUE AQUI e leia mais artigos de Eduardo Moraes.
Eduardo Moraes é jornalista formado pela USCS (Universidade Municipal de São Caetano do Sul) além de fotógrafo há 15 anos. Em seu curriculum estão o Jornal e Site Abalo, a Exposição O "T" da Questão e o Livro Avesso - Meu Lado Certo. Atualmente é editor-chefe do site www.EmNeon.com.br